De Povos Indígenas no Brasil
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Notícias

Índio não impede o desenvolvimento

30/08/2008

Autor: Edgard Patrício

Fonte: O Povo - www.opovo.com.br



O Supremo Tribunal Federal reiniciou, essa semana, o julgamento da Ação Popular, de autoria do senador Augusto Botelho, que pede que não seja contínua a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Se não for contínua a demarcação, os índios vão viver em 'ilhas', isolada uma aldeia da outra. No meio delas, os arrozeiros poderiam explorar a terra. Um dos principais argumentos dos que são contrários à demarcação das terras indígenas é que muitas delas estão em terrenos privilegiados economicamente. E que, portanto, a demarcação poderia refrear o desenvolvimento. Um exemplo, aqui no Ceará, é a tentativa do governo do Estado, subsidiando investimentos privados, de avançar sobre as terras dos índios anacés, nas redondezas do Porto do Pecém.

Sobre o falso antagonismo índio e desenvolvimento, vale aqui ressaltar o que pensa o relator do julgamento da Ação Popular sobre a Raposa Serra do Sol, ministro Carlos Ayres Brito, do Supremo Tribunal Federal. Aliás, esse é exatamente um dos subtítulos do seu relatório: O falso antagonismo entre a questão indígena e o desenvolvimento. Em seu relatório, de 105 páginas, o ministro faz uma relação, à página 47, entre índio e território. Para ele, a identidade do índio brasileiro "deriva de um fato complexo ou geminado, que é o orgulho de se ver como índio e etnia aborígene, é verdade, mas índio e etnia genuinamente brasileiros. Não uma coisa ou outra, alternativamente, mas uma coisa e outra, conjugadamente. O vínculo de territorialidade com o Brasil a comparecer como elemento identitário individual e étnico".

E é nessa relação entre índio e territorialidade, como substrato de sua identidade, que Carlos Ayres Brito chama atenção para a compreensão errônea do pretenso antagonismo entre índio e desenvolvimento. Segundo o relator, enganam-se os que seguem defendendo essa percepção, pois "ter a chance de demonstrar que o seu tradicional habitat ora selvático ora em lavrados ou campos gerais é formador de um patrimônio imaterial que lhes dá uma consciência nativa de mundo e de vida" é que deveria ser "aproveitada como um componente da mais atualizada idéia de desenvolvimento, que é o desenvolvimento como um crescer humanizado".

E o ministro vai mais longe, quando afirma que se "se prefere o desenvolvimento não só enquanto categoria econômica ou material, servida pelos mais avançados padrões de ciência, tecnologia e organização racional do trabalho e da produção, como também permeado de valores que são a resultante de uma estrutura de personalidade ou modo pessoal-indígena de ser mais obsequioso", necessariamente teríamos que se espelhar no modo de vida indígena. E o ministro vai enumerando em que se assenta esse modo de vida, e que seria uma matriz fundamental para se inaugurar esse desenvolvimento 'obsequioso'.

Entre os princípios desse desenvolvimento, comunga-se "a) da idéia de propriedade como um bem mais coletivo que individual; b) do não-enriquecimento pessoal à custa do empobrecimento alheio (inestimável componente ético de que a vida social brasileira tanto carece); c) de uma vida pessoal e familiar com simplicidade ou sem ostentação material e completamente avessa ao desvario consumista dos grandes centros urbanos; d) de um tipo não-predatoriamente competitivo de ocupação de espaços de trabalho, de sorte a desaguar na convergência de ações do mais coletivizado proveito e de uma vida social sem narsísicos desequilíbrios".

Além disso, "e) da maximização de potencialidades sensórias que passam a responder pelo conhecimento direto das coisas presentes e pela premonição daquelas que a natureza ainda mantém em estado de germinação; f) de uma postura como que religiosa de respeito, agradecimento e louvor ao meio ambiente de que se retira o próprio sustento material e demais condições de sobrevivência telúrica, a significar a mais fina sintonia com a nossa monumental biodiversidade e mantença de um tipo de equilíbrio ecológico que hoje a Constituição brasileira rotula como 'bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida' (art. 225, caput), além de condição para todo desenvolvimento que mereça o qualificativo de sustentado."

O relatório completo do ministro pode ser encontrado no www.stf.gov.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/pet3388CB.pdf.
 

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