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Agressões sofridas pelo povo Cinta Larga, que se diz cansado do assédio e da violência dos invasores de sua terra

09/10/2003

Fonte: Cinta Larga-Espigão D´Oeste-RO



"Aqui nasceram e morreram nossos pais, aqui também nascemos e morreremos, se for preciso, lutando!" Esse é apenas um dos clamores que a Comissão Parlamentar de Direitos Humanos ouviu das lideranças do Povo Cinta Larga, por ocasião da visita desta Comissão à Aldeia Roosevelt, em Rondônia, no dia 09 de outubro. O Relatório das Associações do Povo Cinta Larga denuncia as agressões cometidas inclusive por autoridades públicas e o assédio às riquezas naturais e minerais existentes na terra indígena.

O povo Cinta Larga se diz cansado do assédio por que passa há muitos anos e da violência a que está submetido todos os dias pelos invasores de sua terra.

Reproduzimos na íntegra o Relatório do Povo Cinta Larga.

"O Povo Indígena Cinta Larga neste ato representado pelas Associações Pamaré do Povo Indígena Cinta Larga, Associação Paerenã e Associação Norte Matogrossense, associações estas que representam a unanimidade do nosso povo, ou seja, os menos de cinco por cento sobreviventes ao contato com o povo branco, agradece o ato de nobreza contida na ação da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados Federais em visitar a Comunidade Roosevelt, primeira comunidade indígena Cinta Larga a estabelecer contato com representantes do Governo Federal através da (Fundação Nacional do Índio) Funai, para ver e ouvir os anseios e clamores do nosso povo, conhecer a vida e costumes, tomar ciência e denunciar os inúmeros crimes, abusos, extorsões e toda uma gama de agressões contra o Povo Cinta Larga.

"Agressões estas que se repetem ao longo dos anos de contato com o povo branco e que mancham a honra de toda a humanidade.

"Relatamos para o pleno conhecimento desta Excelsa Comissão, os vários crimes contra o Povo Cinta Larga, a exemplo, citamos a traição que nos foi cometida pela Policia Federal quando no ano de 2000 reuniu-nos no município de Cacoal - RO, solicitando nossa permissão para entrarem na área indígena com o propósito de nos proteger dos garimpeiros que naquele ano já se encontravam em nossas terras.

"Ocorreu, porém que ao final de tudo foram os Cinta Larga, nossas principais lideranças, presos e perseguidos, sendo confundidos com os criminosos e bandidos que tanto apavoram a sociedade. O banditismo, senhores deputados, não faz parte da nossa cultura!

Caiba também lembrar a esta Comissão o terror pregado por policiais, sejam eles civis ou militares, federais ou não, quando de suas ações de repressão. Sendo assim, tivemos nossas casas invadidas sob a mira de armas de fogo de grosso calibre e outras, automáticas, de grande poder de repetição.

Incorporando o inumerável rol de denúncias que lhe faremos, citamos a traição que também nos cometeu o atual governador do estado de Rondônia, o Sr. Ivo Cassol. Primeiro, com promessas de nos ajudar em vários aspectos de nossa vida social, tentou atrair a simpatia do povo Cinta Larga, porém como não confiássemos nos seus propósitos esdrúxulos, ousou publicar notas mentirosas na imprensa local, degradando a imagem e honra de nosso povo, unicamente com o propósito de criar indisposições e desconfiança entre nossa gente e o Governo Federal e seus órgãos representativos tais como o Ministério da Justiça e a Funai.

Não se contentando com a mediocridade de suas ações, talvez por não atingir suas metas, nos traiu mais uma vez, quando ordenou a retirada da polícia ambiental que dava apoio às barreiras que a Funai instalou nos limites de acesso à área indígena Cinta Larga, o que facilitou consideravelmente a incursão de pequenos bandos de garimpeiros, dentro dos perímetros da reserva.

Como se não bastasse, e na verdade não bastou, pois ainda não obtendo sucesso em suas intenções, e não contentando-se com seu apetite desmedido por iniqüidades e injustiças, agora promove abertamente a invasão de nossas comunidades por grupos de garimpeiros fortemente armados, incitando-os à desordem social e a conflitos, que podem vir a surgir, de repercussão internacional.

Fato notório se verifica no cotidiano dos jornais locais (escritos e falados) que, mancomunados com as intenções de extermínio do Sr. Governador, incitam diariamente as massas sociais locais contra o nosso povo, de forma tão severamente distorcida que a atual imagem dita sobre o Povo Cinta Larga faz lembrar a propaganda Nazista contra o povo Judeu.

Notadamente, o movimento apresentado na mídia teve sua origem em reportagens que foram levadas ao ar através do Jornal Nacional, programa televisivo da Rede Globo de Televisão, onde se verificou o súbito aparecimento de garimpeiros oriundos de todas as partes do Brasil e as primeiras hordas de invasores.

Não sendo esta a primeira vez que a Rede Globo de Televisão tenta denegrir a imagem do Povo Indígena Cinta Larga. No passado, agindo da mesma má fé que lhe é peculiar e usando do poder que o veiculo da comunicação lhe assegura, levou ao ar uma série de reportagens mentirosas. Isto lhe valeu uma ação jurídica que até esta data tramita no Supremo Tribunal Federal.

Também lhes relatamos sobre uma infinidade de crimes contra a pessoa dos Cinta Larga, tais como roubos de casas e veículos, estupros e assassinatos que não foram apurado pelas autoridades competentes, onde os culpados, por estarem impunes, desconhecem a força da justiça brasileira.

Esta é uma situação que preocupa todo o Povo Cinta Larga pois abre precedentes para a impunidade de crimes praticados contra nossa gente!

Nós Cinta Larga, agora nos sentimos reféns da sociedade branca, somos prisioneiros em nossa própria terra, nossa própria pátria. Foram os brancos que vieram até as Comunidades Cinta Larga e trouxeram sua cultura até nós!

Queremos segurança e respeito para nossa gente! Não somos culpados por querermos melhorias de vida, por querermos estradas, medicamentos, educação, eletrodomésticos, e todo conforto que a modernidade pode oferecer. Mas sempre vivemos aqui! Não fomos nós que procuramos o povo branco e sim os brancos que vieram até nós, e sim os brancos que nos trouxeram seus costumes, seus vícios, seus males.

Agora somos reféns da riqueza de nossa terra, somos perseguidos por bandidos, por policiais e por alguns que não defendem a honra, a hombridade, os direitos civis e humanos. Estamos presos nos limites de nossas terras com se não fossemos cidadãos brasileiros, arriscamos nossas vidas e nossas comunidades na defesa constante de nossos bens e cultura, recebemos ameaças contra nossas vidas e contra as vidas de nossas mulheres e crianças. Já não podemos enviar nossos filhos às escolas pois não há segurança para eles!

Queremos o comprometimento sério do Governo Federal, do Congresso Nacional e da sociedade brasileira para como povo indígena! Não somente para o povo Cinta Larga, mas para com todo povo Índio brasileiro, no que diz respeito à segurança, autodeterminação e a qualidade de vida digna e com perspectivas para o futuro. Queremos ter nossos filhos em universidades, graduados, servindo não só as nossas comunidades mas sim a toda nação brasileira!

Compreendemos que somente nós sabemos das reais necessidades e anseios de nossa gente! Compreendemos que somente nós podemos determinar o usufruto de nossas riquezas de maneira equânime sem que, para isso, precisemos modificar nossa cultura, que é nossa maior riqueza.

Estamos cansados do assédio por que passamos ao longo de todos estes anos em contato com o povo branco! Estamos cansados de todo tipo de violência a que somos submetidos quotidianamente. Queremos viver em paz e harmonia com nossos vizinhos!

Não abriremos mão de nossas terras, nem de nossas riquezas, nem de nossa cultura! Aqui nasceram e morreram nossos pais, aqui também nascemos e morreremos, se for preciso, lutando!

Agradecemos a preocupação que esta Comissão demonstra para com o Povo Cinta Larga e esperamos providências urgentes para que se solucione de uma vez por todas, esta série de incidentes que tem causado danos irreparáveis a nossa gente
 

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