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Cacique Raoni Metuktire vai participar da Flip 2024: 'Vou falar do meu pensamento e do futuro'

21/08/2024

Fonte: O Globo - https://oglobo.globo.com/



Cacique Raoni Metuktire vai participar da Flip 2024: 'Vou falar do meu pensamento e do futuro'
Mais importante liderança indígena do Brasil lançará suas memórias no ano que vem: 'Ouvi-lo hoje é só um justo e tardio reconhecimento da importância do pensamento ancestral', diz curadora da festa

Ruan de Sousa Gabriel

21/08/2024

Ainda menino, o cacique Raoni Metuktire ouvia do pai histórias sobre as desavenças entre brancos e indígenas. Desde a década de 1970, quando emergiu como uma das principais vozes em defesa dos direitos dos povos originários e do meio ambiente, ele se esforça para que essas "histórias de antigamente" parem de se repetir.

- Não podemos mais aceitar isso. Falo para o meu pessoal: "Temos que viver em paz." Não queremos briga com os brancos, e os brancos não têm que querer briga com a gente. Temos que ser amigos e respeitar um ao outro - diz o cacique em entrevista por vídeo ao GLOBO, diretamente do Instituto Raoni, em Peixoto de Azevedo (MT), nas proximidades dos territórios de seu povo, os kayapó, de onde falou em sua língua nativa (a conversa foi traduzida pelos netos Karanhin e Patxon Metuktire).

Raoni já proclamou seu chamado à paz nos mais diversos cantos do mundo e a líderes que vão do presidente francês Emmanuel Macron ao monarca belga Leopoldo III (1901-1983), dos papas João Paulo II e Francisco ao rei inglês Charles III. Agora, ele se prepara para levar sua mensagem a um "encontro de sábios" que ocorrerá entre os dias 9 e 13 de outubro: a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que, nas últimas edições, abriu espaço a líderes indígenas como Ailton Krenak e Davi Kopenawa.

- Vou falar do meu pensamento e do futuro, para que as novas gerações de brancos e indígenas vivam de forma pacífica e harmônica - afirma o cacique.

Curadora da Flip, Ana Lima Cecilio chama Raoni de "símbolo da existência e da resistência dos povos originários do Brasil" e destaca sua luta para "barrar a destruição da Amazônia, num esforço para barrar a destruição do mundo".

- Ouvi-lo hoje, num festival como a Flip, é só um justo e tardio reconhecimento da importância fundamental do pensamento ancestral. E sempre um lembrete de como temos feito tudo para destruí-lo - afirma.

Tema de documentário
Os primeiros contatos de Raoni com os brancos se dão nos anos 1950, por intermédio dos irmãos sertanistas Orlando, Cláudio e Leonardo Villas-Bôas. A partir da década de 1970, ele se torna liderança inconteste dos povos indígenas do Brasil. Desde essa época, frequenta os meios culturais para difundir suas ideias e denunciar as tragédias enfrentadas pelos povos originários.

Em 1973, ele conheceu o cineasta belga Jean-Pierre Dutilleux. Do encontro, resultou o documentário "Raoni", de 1978. O ator Paulo César Pereio narrou o filme. A dublagem para o inglês ficou a cargo do ator Marlon Brando. "Raoni" foi premiado no Festival de Cinema de Gramado, exibido no Festival de Cannes e concorreu ao Oscar.

Ainda ao lado de Dutilleux, o cacique lançou na França, em 2010, o livro "Raoni, mémoires d'um chef indien" (Raoni, memórias de um chefe indígena). À época, ele buscava apoio na Europa contra a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na bacia do Rio Xingu. No ano que vem, Raoni lança um novo livro de memórias, agora pela Companhia das Letras, escrito em parceria com o antropólogo Fernando Niemeyer.

O principal parceiro de Raoni na arena cultural, porém, ainda é o roqueiro britânico Sting (ex-The Police). Os dois se conheceram nos anos 1980 e, juntos, rodaram o mundo denunciando a destruição da floresta e exigindo a demarcação dos territórios indígenas.

A amizade com o roqueiro perdura até hoje. Em junho de 2023, Sting e a esposa, a atriz Trudie Styler, gravaram um vídeo em apoio ao cacique, que reuniu líderes indígenas em um encontro batizado de "Chamado de Raoni": "Sua proteção da floresta é crucial para todos, porque esses ambientes sequestram carbono e regulam padrões climáticos do mundo", disse o músico.

- Nunca vou me esquecer do trabalho que realizei junto com o Sting. Foi muito bonito - comenta o cacique.

No planalto
Em 1o de janeiro de 2023, Raoni subiu a rampa do Palácio do Planalto de braço dado com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tomava posse para o terceiro mandato.

Em décadas de luta, Raoni sempre cobrou o governo brasileiro - e está prestes a fazê-lo novamente. Ele vai a Brasília ainda esta semana e pretende bater à porta do presidente.

- Quando subi a rampa, Lula me disse que ia ajudar os povos indígenas, que ia trabalhar para o nosso bem e demarcar nossas terras. Encontrei ele de novo, junto com o Macron (em março), e ele repetiu o que havia dito. Mas não falou mais nisso. Quero encontrá-lo novamente para cobrar e falar da situação dos guarani-kaiowá - diz Raoni, referindo-se aos conflitos entre o povo da etnia e os ruralistas no Mato Grosso do Sul. - Também quero ir ao Congresso Nacional para enterrar de vez o projeto do marco temporal (que dificulta a demarcação de terras indígenas).

Não se sabe ao certo a idade de Raoni. A partir de uma foto de 1958, em que ele aparenta ter pouco menos de 20 anos, estima-se que ele já tenha passado dos 90.

- Estou tentando que algum sobrinho ou neto meu se interesse em continuar minha luta em defesa dos povos indígenas. Estou procurando um jovem líder que eu possa apresentar como meu sucessor.

https://oglobo.globo.com/cultura/noticia/2024/08/21/cacique-raoni-metuktire-vai-participar-da-flip-2024-vou-falar-do-meu-pensamento-e-do-futuro.ghtml
 

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