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Reserva ainda está sob ameaça

04/11/2001

Autor: Orlando Morais

Fonte: Diário de Cuiabá-MT



Cinco anos depois da expulsão de 8 mil garimpeiros, madeireiros ainda teimam em aliciar os índios
Ainda é desolador o cenário deixado por sete anos de intensa exploração garimpeira e madeireira na Reserva Indígena Sararé (540 quilômetros a noroeste de Cuiabá), onde habita hoje uma centena de índios nambikwára katitaurlu. No meio de crateras ainda encharcadas de mercúrio, a capoeira e as árvores pioneiras já começam a aparecer. Mas quase cinco anos depois que mais de 8 mil invasores foram expulsos da reserva, ainda se vê o estrago que eles fizeram, tanto no seio da exuberante floresta, quanto no coração dos corajosos índios.

A desintrusão, que era uma exigência do Banco Mundial para que pudesse repassar recursos do Projeto de Desenvolvimento Agroambiental de Mato Grosso (Prodeagro), aconteceu em janeiro de 1997. Participaram da "Operação Sararé II", como foi batizada 40 policiais federais, 110 militares, fiscais do Ibama e funcionários da Funai, além de soldados do Exército. O Diário registrou o caso, desde as primeiras denúncias, até a saída do último invasor, em mais de 30 páginas de reportagens. Na semana passada, a convite da Funai, o Diário voltou à região.

Em 1997, perante o aparato policial, a saída dos exploradores foi "pacífica", apesar de muitos deles andarem armados. Dentro da reserva, já estavam montadas verdadeiras cidades de lona preta, com toda a infra-estrutura para garantir o funcionamento de 200 dragas e atender aos garimpeiros em suas necessidades básicas: armazéns, cinemas, farmácias e bordéis. Quase tudo foi derrubado e queimado pelos policiais.

A operação durou 25 exaustivos dias e custou em torno de R$ 300 mil - incluindo o atendimento médico a dezenas de doentes de malária, a hospedagem temporária e o transporte das famílias para cidades do norte do Estado, principalmente Peixoto do Azevedo. Boa parte delas, no entanto, não tinha para onde ir e deixou-se ficar à própria sorte nas cidades vizinhas à reserva, como Pontes e Lacerda e Nova Lacerda.

Na ocasião, técnicos do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) calcularam um prazo de 40 anos para que a natureza de Sararé se recuperasse. Córregos haviam sido assoreados, nascentes destruídas, rios contaminados e dois mil hectares de floresta derrubados. Até hoje, a Funai tem dificuldade de encontrar água potável para os índios. Os danos ambientais foram tão grandes, segundo o DNPM, que nem todo o ouro que havia na área pagaria um projeto de recuperação.

Foi o que constatou o chefe do escritório da Funai em Cuiabá, Ariovaldo José Santos, logo após a saída dos invasores, "mesmo porque nenhuma multa ambiental foi aplicada até hoje", disse ele. Assim, os recursos que a Funai recebeu do Prodeagro serviram apenas para reocupar a reserva com os remanescentes dos nambikwára e para vigiar a área contra novas invasões. Isso porque a desintrusão valeu apenas para os garimpeiros: madeireiros e palmiteiros circundam até hoje a área e não pensam duas vezes em entrar ao menor sinal de descuido.

A reserva indígena Sararé foi demarcada em 1985 e possui uma área de 67,4 mil hectares nos municípios de Vila Bela da Santíssima Trindade, Pontes e Lacerda e Conquista d'Oeste. Nas áreas preservadas, a vegetação dominante é a Floresta Estacional Semidecidual, com árvores típicas tanto do Cerrado quanto da Floresta Amazônica e várias espécies de madeira-de-lei. Com o metro cúbico do mogno, por exemplo, custando R$ 770, é de se imaginar a cobiça que desperta na região árvores das quais se pode retirar até 70 metros cúbicos de madeira.

Para aliciar os índios, os exploradores dão "presentes" - como arroz, açúcar e até motocicletas - ou oferecem aos mais jovens um mês de estadia em casas de prostituição de Pontes e Lacerda. Nesse período, os madeireiros saqueiam como podem a reserva. O Ibama só atua na área, de acordo com o diretor de fiscalização do órgão, Marcos Pinto Gomes, quando a Funai solicita ou quando uma denúncia grave chega a Cuiabá.

Nesse estado de coisas, a Funai tenta a liberação, pela Justiça Federal, de R$ 250 mil arrecadados com o leilão de madeira apreendida ainda em 1995, para implementar em Sararé atividades que dêem autonomia econômica para os índios (leia na próxima página) - e para que eles não dependam mais dos presentes de grego dos brancos.
 

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