De Povos Indígenas no Brasil

Notícias

Pouco apoio a índios doentes

08/08/2007

Fonte: CB, Cidades, p. 26



Pouco apoio a índios doentes
Abrigo deveria receber até 70 pacientes de todo o país para tratamento médico no DF. Mas sofre com superlotação e falta de verba para pagar servidores, melhorar instalações e comprar material de limpeza

Edma Cristina de Góis
Da equipe do Correio

A Casa de Apoio à Saúde do Índio, no Km 20 da BR-060, funciona como uma espécie de hospedaria para indígenas com problemas de saúde e que buscam tratamento médico no Distrito Federal. Mas os atuais ocupantes do lugar - das tribos Xavante e Xingu - correm o risco de serem transferidos para unidades similares espalhadas pelo país ou voltarem para suas cidades de origem. O convênio da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) com o Instituto Recicla Brasil, responsável pela administração do abrigo, no valor de R$ 2,9 milhões, acabou no final de junho. O contrato foi prorrogado por mais um ano, mas ainda não houve a liberação do dinheiro porque uma auditoria interna da Funasa analisa problemas de administração da entidade conveniada. Sem verbas, os funcionários da casa não recebem salários há três meses. Além disso, falta material de limpeza e as instalações estão precárias.

A estrutura da Casa de Saúde é antiga. Os abrigados convivem com colchões e camas velhos, banheiros coletivos (para homens, mulheres e crianças) sujos e desgastados. Mas o maior problema é a falta de limpeza, porque o material acabou. O diretor do Departamento de Saúde Indígena da Funasa, Wanderley Guenka, admite que a diminuição de hóspedes e a transferências de alguns pacientes são as soluções emergenciais para minimizar a crise. "Recomendamos que haja o menor número possível de novos hóspedes", afirmou. Também há a possibilidade de se fazer convênios com outras instituições a médio prazo.

Segundo o coordenador do Instituto Recicla Brasil, Irair Abimael, as dificuldades administrativas se devem à burocracia da Funasa, que demora para liberar autorizações e verbas. "Hoje a casa não tem condições de atendimento. Querem acabar com ela", reclamou. O Instituto é responsável pelos serviços gerais, manutenção, compra de medicamentos e pagamento dos 45 funcionários - 15 deles são técnicos em enfermagem, mas há também um enfermeiro, um nutricionista e um médico. Embora não ofereça atendimento clínico, a casa providencia serviços como troca de curativos, aplicação de soro, orientações sobre medicamentos indicados por especialistas, dentre outros.

Hoje, há 74 índios no local, sendo 25 pacientes em tratamento e 49 acompanhantes. O levantamento de quantas pessoas foram recebidas no mês passado ainda não foi concluído. De acordo com o coordenador da casa, Gilberto Batista de Lima, a superlotação é um dos agravantes da situação. "Eles precisam tratar problemas de saúde e trazem a família. Há ainda aqueles que usam a casa como pretexto para vir à capital federal protestar. Mas não temos como não recebê-los", explica. Segundo ele, a casa já hospedou 295 pessoas. A capacidade é para até 70. A casa conta ainda com uma ambulância e duas vans, compradas com recursos da Funasa, para levar os índios até as unidades de saúde. A maioria dos abrigados faz tratamento nos hospitais Universitário de Brasília (HUB) e de Base do Distrito Federal (HBDF).

A Casa de Saúde do Índio foi criada em 1999. Em geral, os índios ali abrigados vêm para a capital devido à falta de serviços médicos em seus locais de origem. Hoje, 73 Casas de Saúde do Índio funcionam nas regiões brasileiras com população indígena. A idéia é que os pacientes e familiares retornem para suas tribos depois de curados. No entanto, alguns precisam de tratamentos regulares e passam mais tempo do que o previsto inicialmente. É o caso de Irenilda Maria dos Santos, 40 anos, da tribo Xucuru do Ororubá, no interior de Pernambuco. Ela está há três anos na casa do DF. A coordenação do abrigo já fez contato com hospitais em Pernambuco para tentar transferi-la em breve.

"Vim para cá porque onde morava o serviço de saúde não era bom. Eu poderia perder a perna", contou Irenilda, que é portadora da síndrome do anticorpo antifosfolípede. A doença compromete a circulação e a coagulação sangüíneas. Irenilda se recupera de uma trombose na perna direita há sete anos. Além disso, também tem dificuldades hepáticas. Além de remédios para minimizar a dor, ela também precisa trocar os curativos duas vezes ao dia.

A coordenadora de enfermagem da casa, Vanessa Almeida, disse que há mais de uma semana foram pedidos medicamentos especiais e material de limpeza à Funasa, mas nada chegou. Ela alerta que o grande número de abrigados se deve a uma falha nos atendimentos fora do DF. "Cerca de 70% dos problemas de saúde que chegam aqui são de atenção básica, ou seja, poderiam e deveriam ser tratados em seus locais de origem", concluiu.

A única chance
A índia Verônica Xavante, 40, chegou à Casa de Saúde do Índio há uma semana, mas disse não ter encontrado o que esperava. Ela tem problema de hérnia e no Mato Grosso, onde mora, não conseguiu atendimento adequado. Ao chegar ao DF, deparou-se com outras dificuldades. "Os quartos estão sujos e com mau cheiro", reclamou. As duas filhas de Verônica, Júlia, 6, e Áurea, 2, também estão doentes. A mais velha se recupera de leishmaniose e a mais nova, de sopro no coração.

A história de Verônica é parecida com a da maioria dos índios de passagem pela casa: ninguém sabe ao certo quando irá embora. "Se eu pudesse voltar, eu voltaria, mas aqui é minha única chance", explicou. Adão Xerente, 27, de Tocantis, está na casa de saúde acompanhando o pai, Bernaldinho Xerente, 61, que tem diabetes, problema na vesícula e hepatite. "A casa aumenta a nossa chance de cura. Mas a situação aqui está muito difícil. E se isso acabar?", preocupou-se.

CB, 08/08/2007, Cidades, p. 26
 

As notícias publicadas no site Povos Indígenas no Brasil são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos .Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.