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RAPOSA SERRA DO SOL - Índios fecham rodovia transarrozeira

07/05/2008

Autor: Cyneida Correa

Fonte: Folha de Boa Vista




Índios ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR) fecharam ontem uma das rodovias que dá acesso à reserva Raposa Serra do Sol. O fechamento está impedindo a retirada de 25 mil sacas de arroz da fazenda Caju, que estão estragando na lavoura e em caminhões.

Desesperados, os rizicultores ainda tentaram conversar com os índios que bloquearam a RR-319, uma das rodovias que dá acesso à reserva, mas foram ameaçados e tiveram que se retirar do local.

"Em dois dias o arroz estraga. Tenho arroz para transportar que daria para abastecer Boa Vista durante um mês inteiro. Vou perder tudo com esse bloqueio sem sentido e ninguém faz nada para nos ajudar. Quero tirar meu arroz e não tenho como fazer isso", disse bastante emocionado o rizicultor Ivo Barili.

Impotente em reverter a situação criada pelo fechamento da rodovia, o agricultor disse que não sabia mais a quem recorrer. Ele contou que vive há 15 anos no local e que quando chegou não existia nada na região. "Eu recuperei a estrada e plantei meu arroz. Sou um trabalhador e agora vejo o trabalho de um ano inteiro ser perdido. Se não tirar hoje o arroz de lá, em 24 horas vai estragar tudo. Já fui à Polícia Federal, mas não tiraram os índios, disseram que tenho que ter mandado judicial. Não entendo isso, gente. Estão bloqueando uma estrada e isso não pode", desabafou. O arroz plantado na fazenda Caju abastece além de Roraima, Manaus (AM) e Santarém (PA).

De acordo com Ivo, ainda faltam colher o equivalente a 25 mil sacas de arroz, cada uma com 50 quilos, somente na sua fazenda. "Nós trabalhamos, pagamos nossos impostos em dia, damos emprego, não é possível que ninguém vá nos ouvir", comentou Barili.

Rizicultora se desespera com bloqueio

A rizicultora Regina Barili estava chorando na estrada. Revoltada com o bloqueio, ela desabafou: "É difícil não se revoltar com isso. Tentamos agir pela Justiça, fomos à PF e pedimos que desobstruíssem a estrada, mas nos mandam para outros órgãos. Seu trabalho e sua dignidade ficam no chão o tempo inteiro. Tudo vai por água abaixo", disse.

Ela afirmou que são tratados como bandidos em suas casas, quando pagam impostos e trabalham. "Somos trabalhadores e lutamos por uma vida digna. Isso não é levado em consideração. Nosso direito de ir e vir não é preservado", afirmou.

A agricultora lia uma Constituição Federal para compreender de que forma a Carta Magna poderia ajudar. "A Constituição não é respeitada aqui e nem existe. Já nem sei mais o que é certo ou errado, nós somos agricultores e não entendemos de lei, apenas sabemos trabalhar. Estamos perdendo a cabeça, pois já fizemos tudo que devíamos e nada resolveu", disse.

Motorista afirma que índios estavam com rifles e flechas

"Agora eles têm mulheres e crianças. Mas ontem eram caboclos nos ameaçando com rifles e flechas", disse o motorista do caminhão, Vanderlan Souza. Ele contou que o veículo foi cercado por 160 índios por volta das 13h30 de segunda-feira.

"Eu fiquei com medo e disse que não queria briga com ninguém, que me deixassem trabalhar, pois estava apenas dirigindo caminhão. Eles iam me deixar dar a volta no carro, mas chegou uma mulher braba que mandou eu dar meu jeito e disse para não facilitarem, senão eu acostumava", comentou.

O caminhão que o motorista transportava arroz quebrou com a dificuldade em fazer o retorno na estrada estreita. "Agora ficamos no prejuízo", frisou.

Mulheres e crianças fazem bloqueio

Mulheres e crianças. Esses foram os escudos utilizados pelos índios para fecharem a rodovia transarrozeira que liga Boa Vista às fazendas de arroz localizadas dentro da reserva indígena Raposa Serra do Sol. No local havia inclusive bebês de colo.

Os manifestantes são cerca de 80 indígenas da aldeia Jauari, localizada dentro da reserva Raposa Serra do Sol. "Aqui não é rodovia. É apenas vicinal de arroz. E não vamos sair daqui porque não vamos mais deixar passar nenhum arroz nesta estrada", disseram os índios que estavam à frente do movimento.

Com câmeras fotográficas e binóculos, eles monitoravam toda a movimentação da Polícia Federal e dos jornalistas. Bastante arredios, não quiseram se identificar para a imprensa e afirmaram que não falam mais com jornalistas. "A terra é nossa e não vamos esperar nenhuma decisão da Justiça, porque eles não decidem nada aqui. Quem decide somos nós e nessa estrada ninguém passa. Não queremos arrozeiros aqui", disse o homem que se identificou como tuxaua.

Ele afirmou ainda que o fechamento da estrada faz parte de uma série de manifestações que vão ocorrer em toda a Raposa Serra do Sol, coordenada pelos índios do Conselho Indígena de Roraima (CIR), que é contra a permanência de arrozeiros no local.

Policiais federais e um observador da Fundação Nacional do Índio (Funai) estavam no local. O funcionário da Funai, João Batista, disse que não poderia falar com a imprensa, pois veio de Brasília participar da retirada de não-índios e seu coordenador o enviou para verificar o fechamento da estrada. "Quando os tuxauas decidem fazer algo tem que ter paciência. Não podemos interferir na terra deles", disse.

Já os policiais federais e os representantes da Força Nacional disseram que não poderiam retirar as pessoas do meio da rodovia. "Se o juiz decidir, a gente retira. Senão, eles ficam, pois não podemos tumultuar", disse um dos federais.
 

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