De Povos Indígenas no Brasil
Notícias
Índios comemoram
11/12/2008
Fonte: CB, Brasil, p. 16
Índios comemoram
Mesmo com novo pedido de vista, feito por Marco Aurélio Mello, ministros do STF antecipam votos e se manifestam a favor da demarcação contínua da reserva e da retirada dos produtores de arroz da área
Mirella D'Elia
Da equipe do Correio
Apesar da resistência de um de seus integrantes, o Supremo Tribunal Federal (STF) já delineou o entendimento sobre o futuro da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. A maioria dos ministros votou ontem pela manutenção da demarcação em faixa contínua, como estabelecido pela União, mas impôs 18 condições para a ocupação da área, por sugestão do ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Mantido o posicionamento, os índios sairão vitoriosos: continuarão na área, respeitadas as ressalvas estabelecidas pelo STF, e os arrozeiros terão que sair. A conclusão, entretanto, foi adiada para o ano que vem.
Até agora, oito dos 11 ministros já se pronunciaram pela regularidade da demarcação em área contínua. "As alegações (da ação contrária à demarcação) são meramente especulativas, principalmente no que diz respeito à soberania e à segurança nacional, assim como à economia do estado", disse Joaquim Barbosa, ao votar. Lideranças indígenas celebraram. "É hora de comemorar", resumiu Joenia Wapichana, advogada do Conselho Indígena de Roraima (leia mais na página 17).
Iniciado em agosto, o julgamento da ação que questiona o formato da demarcação só não foi encerrado por causa da inesperada atitude do ministro Marco Aurélio Mello, que pediu para analisar melhor o caso. Mello disse ainda que só vai se pronunciar no ano que vem. Com isso, o resultado - salvo alguma mudança - sairá apenas depois de fevereiro de 2009, quando terminará o recesso do Judiciário. "Hoje, já temos votos claros no sentido de que a demarcação é legitima. Aguardam-se três votos, mas já há votos nesse sentido. Vamos aguardar o voto-vista do ministro Marco Aurélio. Em pouco tempo teremos isso decidido", comentou o presidente do Supremo, Gilmar Mendes. Ele disse esperar uma decisão ainda no primeiro semestre do ano que vem.
Entre as condições impostas para a ocupação da reserva destacam-se a não-exploração, pelos índios, de recursos naturais e a proibição do garimpo e da cobrança de pedágio. As terras também não poderão ser arrendadas (veja quadro). A decisão vai servir de parâmetro para futuras demarcações. "A partir de agora, teremos um tempo para reflexão - inclusive o governo, que vai ter que reconstruir o procedimento demarcatório", disse Mendes.
O NÚMERO
1,7 mil hectares é o tamanho da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima
Possíveis restrições
O ministro Carlos Alberto Menezes Direito (foto) votou a favor da demarcação contínua da reserva, mas sugeriu restrições. Veja abaixo algumas condições que os índios deverão obedecer caso o voto do ministro sirva de base para a decisão do STF
O usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos pode ser suplantado de maneira genérica sempre que houver o interesse público da União na forma de Lei Complementar. O direito dos índios pela terra não inclui a exploração de recursos hídricos e energéticos, a pesquisa e a lavra de recursos naturais e a garimpagem, que ficam condicionadas a autorização dada pelo Congresso.
O uso da área fica condicionado ao interesse da Política de Defesa Nacional. A atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na reserva fica garantida, bem como a instalação de redes de comunicação, estradas e vias de transporte, equipamentos e prédios públicos, especialmente os de saúde e de educação.
As unidades de conservação ambiental ficam sob responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que responderá pela administração da área. O trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido nas áreas de conservação.
O trânsito e a permanência de não-índios no restante da terra indígena serão permitidos, sem cobrança de quaisquer tarifas, observadas as condições estabelecidas pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Também não poderá haver cobrança pela utilização das estradas e outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público na reserva.
As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício da posse direta pelos índios.
Os não-índios não podem caçar, pescar, coletar frutas ou exercer atividades agropecuárias na reserva.
Os bens do patrimônio indígena, isto é, as terras pertencentes ao domínio dos grupos e comunidades indígenas, gozam de plena isenção tributária.
Fica vedada a ampliação da terra indígena já demarcada.
Os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis.
Ministros discutem
Logo no início da sessão, o ministro Marco Aurélio Mello tentou interromper o julgamento, ao adiantar que pediria vista do processo. Ele fez o anúncio após o voto de Carlos Alberto Menezes Direito, que havia interrompido a sessão em agosto. Mesmo assim, outros seis ministros resolveram adiantar seus votos, por considerarem importante uma posição do Supremo Tribunal Federal ainda ontem.
Marco Aurélio aparentou irritação com a decisão de seus colegas de Corte. Além dele, só faltam votar Celso de Mello e o presidente Gilmar Mendes. "Aguardamos 20 anos e agora vamos ser açodados? Depois que o Supremo bate o martelo, acabou. Não adianta nem fazer uma carta ao Santo Padre (papa), porque não vai adiantar", ironizou Marco Aurélio, para argumentar que a decisão exigia uma reflexão maior.
O clima esquentou no fim do julgamento. Diante da insistência de Carlos Ayres Britto para que Gilmar Mendes revogasse a liminar que suspendeu a operação da Polícia Federal (PF) para a retirada dos arrozeiros da reserva, Marco Aurélio reagiu e os dois ensaiaram um bate-boca. "Eu me pergunto se este ainda é um colegiado. Seria o caso de cassar a vista que eu pedi do processo? Vossa Excelência chega a esse ponto, a essa teratologia?", indagou. Ayres Britto respondeu que não caberia pedir mais tempo para analisar uma liminar. E o ministro aumentou ainda mais o tom. "Não cabe? Após 30 anos de colegiado estou aprendendo com Vossa Excelência." Gilmar Mendes disse que a revogação da liminar só seria discutida com o encerramento do julgamento.
CB, 11/12/2008, Brasil, p. 16
Mesmo com novo pedido de vista, feito por Marco Aurélio Mello, ministros do STF antecipam votos e se manifestam a favor da demarcação contínua da reserva e da retirada dos produtores de arroz da área
Mirella D'Elia
Da equipe do Correio
Apesar da resistência de um de seus integrantes, o Supremo Tribunal Federal (STF) já delineou o entendimento sobre o futuro da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. A maioria dos ministros votou ontem pela manutenção da demarcação em faixa contínua, como estabelecido pela União, mas impôs 18 condições para a ocupação da área, por sugestão do ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Mantido o posicionamento, os índios sairão vitoriosos: continuarão na área, respeitadas as ressalvas estabelecidas pelo STF, e os arrozeiros terão que sair. A conclusão, entretanto, foi adiada para o ano que vem.
Até agora, oito dos 11 ministros já se pronunciaram pela regularidade da demarcação em área contínua. "As alegações (da ação contrária à demarcação) são meramente especulativas, principalmente no que diz respeito à soberania e à segurança nacional, assim como à economia do estado", disse Joaquim Barbosa, ao votar. Lideranças indígenas celebraram. "É hora de comemorar", resumiu Joenia Wapichana, advogada do Conselho Indígena de Roraima (leia mais na página 17).
Iniciado em agosto, o julgamento da ação que questiona o formato da demarcação só não foi encerrado por causa da inesperada atitude do ministro Marco Aurélio Mello, que pediu para analisar melhor o caso. Mello disse ainda que só vai se pronunciar no ano que vem. Com isso, o resultado - salvo alguma mudança - sairá apenas depois de fevereiro de 2009, quando terminará o recesso do Judiciário. "Hoje, já temos votos claros no sentido de que a demarcação é legitima. Aguardam-se três votos, mas já há votos nesse sentido. Vamos aguardar o voto-vista do ministro Marco Aurélio. Em pouco tempo teremos isso decidido", comentou o presidente do Supremo, Gilmar Mendes. Ele disse esperar uma decisão ainda no primeiro semestre do ano que vem.
Entre as condições impostas para a ocupação da reserva destacam-se a não-exploração, pelos índios, de recursos naturais e a proibição do garimpo e da cobrança de pedágio. As terras também não poderão ser arrendadas (veja quadro). A decisão vai servir de parâmetro para futuras demarcações. "A partir de agora, teremos um tempo para reflexão - inclusive o governo, que vai ter que reconstruir o procedimento demarcatório", disse Mendes.
O NÚMERO
1,7 mil hectares é o tamanho da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima
Possíveis restrições
O ministro Carlos Alberto Menezes Direito (foto) votou a favor da demarcação contínua da reserva, mas sugeriu restrições. Veja abaixo algumas condições que os índios deverão obedecer caso o voto do ministro sirva de base para a decisão do STF
O usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos pode ser suplantado de maneira genérica sempre que houver o interesse público da União na forma de Lei Complementar. O direito dos índios pela terra não inclui a exploração de recursos hídricos e energéticos, a pesquisa e a lavra de recursos naturais e a garimpagem, que ficam condicionadas a autorização dada pelo Congresso.
O uso da área fica condicionado ao interesse da Política de Defesa Nacional. A atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na reserva fica garantida, bem como a instalação de redes de comunicação, estradas e vias de transporte, equipamentos e prédios públicos, especialmente os de saúde e de educação.
As unidades de conservação ambiental ficam sob responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que responderá pela administração da área. O trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido nas áreas de conservação.
O trânsito e a permanência de não-índios no restante da terra indígena serão permitidos, sem cobrança de quaisquer tarifas, observadas as condições estabelecidas pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Também não poderá haver cobrança pela utilização das estradas e outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público na reserva.
As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício da posse direta pelos índios.
Os não-índios não podem caçar, pescar, coletar frutas ou exercer atividades agropecuárias na reserva.
Os bens do patrimônio indígena, isto é, as terras pertencentes ao domínio dos grupos e comunidades indígenas, gozam de plena isenção tributária.
Fica vedada a ampliação da terra indígena já demarcada.
Os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis.
Ministros discutem
Logo no início da sessão, o ministro Marco Aurélio Mello tentou interromper o julgamento, ao adiantar que pediria vista do processo. Ele fez o anúncio após o voto de Carlos Alberto Menezes Direito, que havia interrompido a sessão em agosto. Mesmo assim, outros seis ministros resolveram adiantar seus votos, por considerarem importante uma posição do Supremo Tribunal Federal ainda ontem.
Marco Aurélio aparentou irritação com a decisão de seus colegas de Corte. Além dele, só faltam votar Celso de Mello e o presidente Gilmar Mendes. "Aguardamos 20 anos e agora vamos ser açodados? Depois que o Supremo bate o martelo, acabou. Não adianta nem fazer uma carta ao Santo Padre (papa), porque não vai adiantar", ironizou Marco Aurélio, para argumentar que a decisão exigia uma reflexão maior.
O clima esquentou no fim do julgamento. Diante da insistência de Carlos Ayres Britto para que Gilmar Mendes revogasse a liminar que suspendeu a operação da Polícia Federal (PF) para a retirada dos arrozeiros da reserva, Marco Aurélio reagiu e os dois ensaiaram um bate-boca. "Eu me pergunto se este ainda é um colegiado. Seria o caso de cassar a vista que eu pedi do processo? Vossa Excelência chega a esse ponto, a essa teratologia?", indagou. Ayres Britto respondeu que não caberia pedir mais tempo para analisar uma liminar. E o ministro aumentou ainda mais o tom. "Não cabe? Após 30 anos de colegiado estou aprendendo com Vossa Excelência." Gilmar Mendes disse que a revogação da liminar só seria discutida com o encerramento do julgamento.
CB, 11/12/2008, Brasil, p. 16
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